terça-feira, 14 de abril de 2020

Domingo de Ramos II

 


Estranho Domingo de Ramos
            se vive em todo o país,
            nos meus oitenta e sete anos
            só posso sentir-me infeliz.

            Estou em luta com a praga
            do maldito que nos mata,
            cada instante alguém se apaga
            mesmo com viseira e bata.

            Já não há mais hospitais
            e os médicos estão doentes,
            vão trata-los nos quintais
            em tendas com os pacientes.

            Ainda não chegou ao pico
            e a mortandade a subir,
            morre o pobre morre o rico
            já não dá mais p'ra fingir.

            Pais e filhos estão fechados
            e, em casa o mal espreita,
            vive em pulmão infestado
            e para entrar ele se ajeita.

domingo, 5 de abril de 2020

Vida Dupla


Ter duas vidas na vida
           não é p'ra qualquer pessoa,
           uma à vista outra escondida
           encapa sempre a menos boa.

           Sendo nobre ou seja ator
           a cartilha é o engano,
           mesmo a freira ou o prior
           ou o bispo no Vaticano.

           A vida oculta de aparências
           diz Francisco aos Cardeais,
           não se esfuma em penitências
           e são grandes nódoas morais.

           O ser padre e não casado
           é provocação à natureza,
           fonte de abuso e pecado
           em abastança ou na pobreza.

           A fé cristã quando é pura
           ajuda a suportar grande dor,
           dá-nos noite menos escura
           e vemos o amanhã doutra cor.

Moral




Quem sou eu p'ra te julgar
          pois dizem que fazes mal,
          ser injusto e querer pensar
          que eu sou dono da moral.

          Terei culpa em ser assim?
          mas não pedi p'ra nascer,
          houve quem pensou por mim
          querendo o que eu ia ser.

          Milhões de seres neste mundo
          mas não há nenhum igual,
          por mais que façam estudo
          em ser humano ou animal.

          O Jorge quer ser perfeito
          e o irmão vai à igreja,
          para o Jorge ele tem defeito
          e ele quer ser o que deseja.

          As peças com que fui feito
          são parecidas não iguais,
          no molde e do mesmo jeito
          mesmo tempo mesmos pais.

          Nós nunca iremos saber
          de onde vim e porque estamos,
          mas sabemos que ao morrer
          de grande viagem voltamos.

O Ditador





Pensei não voltar a ver
          o que já vi em Birkenau,
          por ser um pequeno ser
          pisado por outro ser mau.

          Chamar ser ao novo vírus
          é respeitar o seu poder,
          por não se medir aos quilos
          mais teremos que o temer.
  
          Em caixões bem alinhados
          numa igreja estão à espera,
          para um forno os queimar
          matando a fome a tal fera.

          Estamos fechados em casa
          e nas ruas é um deserto,
          o vírus é grande ameaça
          e ninguém o quer por perto.

          Seja um vírus ou ditador
          a mandar nesta matança,
          só nos traz doença e dor
          do velhinho ou à criança.

Vírus do Século






Há três semanas na moldura
          já penso ser um retrato,
          mas é a forma mais segura
          de me defender do buraco.

          Vejo de longe um vizinho
          que passa com a boca tapada,
          sem falar, eu ando sozinho
          e não saio da minha morada.

          vai ser longo o isolamento
          e as mortes são aos milhares,
          dos que vão, fica um lamento
          que os velhos fiquem nos lares.

          Não se vislumbra um final
          deste castigo tão forte,
          nesta luta que é mortal
          que se estende até ao norte.

          Diz o Papa e com razão
          ninguém se salva sozinho,
          vamos todos dar a mão
          e salvar o nosso vizinho.

Vida Hoje




Já lá vão os quinze dias
          da quarentena obrigatória,
          estava certo o que dizia
          são muitos no crematório.

          Acordo ou vou-me deitar
          e de dia faço a limpeza,
          já me começo a cansar
          vou ter uma vela acesa.

          Ouço a rádio o dia inteiro
          com locutores a brincar,
          mas a intenção é primeiro
          para o meu moral levantar.

          Ainda o estão estudando
          as nossas mentes brilhantes,
          mas ele, muitos vai matando
          enganando os seus tratantes.
         
          Dizem que o homem é grande
          e o vírus coisa pequenina,
          que voa e no ar se expande
          sem o homem ter uma vacina.

2020 Negro




O longo isolamento não acaba
          maldito silêncio me assusta,
          estou numa gaiola fechada
          e o vírus matando gente justa.

          Avança pelo mundo como herói
          o vencedor não tem fronteiras,
          entra em cada corpo e o destrói
          tombando todas as barreiras.

          Não há Continente que o queira
          mas ele é forte e se instala,
          viaja e não precisa de cadeira
          vai de graça e não leva mala.     

          Sem defesas e remédio no avanço
          vai chegar até ao fim do mundo,
          ao findar talvez, no seu descanso
          Os humanos poderão tê-lo moribundo.

          Por certo merecemos tal castigo
          ao não respeitar nosso planeta,
          comemos tudo: até um fiel amigo
          destruímos tudo o que se aguenta.