Ainda é noite e o dia vem,
fora da cama me diz a mãe,
eu, resmungando, meio a dormir
procuro sapato e a meia rota
enquanto a mãe aquece a sopa,
muito embrulhado, tento sorrir.
Demoro tempo p'ra lá chegar,
mas, é preciso ir trabalhar,
meio ensonado espero transporte,
já vão colegas e outra gente
dentro do carro fica mais quente
lá vamos indo mais para norte.
No meu trabalho sou tecelão,
desfio a fibra ou algodão,
fazendo fronhas p/rás raparigas
mas são as mães que as vão comprar
porque por elas, não vão casar,
vão viver juntas, boas amigas.
O dia hoje já vai comprido,
por agora chega, diz o amigo
voltar p'ra casa com multidão,
todos correm p'ra chegar cedo,
já é de noite e não tenho medo
trabalho e sou, bom cidadão.
Minha mãe fez-me o jantar
mas hoje, ela vai esperar,
tenho um encontro marcado,
vi dois olhos tão brilhantes
mais pareciam diamantes
dentro de um rosto rosado.
Ela olhou p'ra mim e sorriu,
mas com ar que não mentiu
e como eu fiquei deslumbrado
desci na mesma paragem,
falamos sobre a viagem
e penso, bem, estou acordado.
Por onde andaste malandro
que eu vi as horas passando
e guardando o teu jantar,
venho tarde mas contente
no meio de tanta gente
encontrei quem namorar.
Vê lá filho o que tu fazes
porque as mulheres são capazes
de enfeitiçar qualquer homem,
eu mais tu vivemos bem
e vais trazer não sei quem
e as nossas poupanças somem.
Minha mãe, não pense assim,
o que eu quero para mim
nisso eu estou a pensar,
vou trazê-la cá p'ra casa
aquecemos com a mesma brasa
e talvez possa até casar.
Filho, a nossa casa é pequena
e eu, debaixo daquela empena
talvez me possa deitar,
tu vais ocupar meu quarto
e assim fica mais barato
sem outra casa alugar.
Mãe não vai ser tanto assim
se os pais gostarem de mim
vou viver na casa dela,
porque não tem mais irmãos
e somos todos bons cristãos
assim vou casar com ela.
Ó meu filho eu só te digo
casa, mas não vou contigo,
fico bem na nossa casa,
sozinha cumprindo a sorte
à espera que o vento norte
me mande um neto na asa.
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